Contos: ATÉ O ÚLTIMO PEDAÇO pt.10

JM

Quando abri os olhos me vi dentro do que parecia ser o jardim de inverno de uma grande casa. Estava cercada por paredes altas e vidro. O teto sobre minha cabeça era de treliça, que filtrava um pouco da luz da Lua. Fazia um frio tenebroso naquele lugar. Numa das paredes havia uma janela de dormitório, mas ela estava no piso superior da casa, fora do meu alcance. Ao meu redor vi um banco de jardim, algumas folhagens, uma roseira e um canteiro de grama japonesa. Aquele jardim de inverno tinha duas paredes de vidro. Atrás delas pude vislumbrar uma sala contendo um piano de caudas e uma grande mesa de jantar. A casa estava na penumbra de uma luz cujo foco estava além do meu alcance. Eu tremia de frio e medo, me perguntando e lamentando ao mesmo tempo, como Daniel havia me encontrado tão rapidamente?
Tomei subita consciência de que a luz que fracamente iluminava a sala de jantar, vinha da cozinha da casa, onde talvez ele estivesse preparando o caldo no qual iria me cozinhar. Gritei de terror. Queria que ele me ouvisse e viesse, tinha esperanças de convencê-lo a abandonar aquela idéia.
Ouvi passos e uma luz ascendeu na sala.
Por um instante pensei que meus olhos estivessem me enganando, porque o homem que parou do outro lado do vidro na minha frente era não era o Dr. Daniel.
Não sei se ainda estava sob efeito da droga que ele usara para me nocautear, mas tive a louca idéia de que aquele homem, fosse talvez uma versão do Dr. Daniel, modificada por alguma cirurgia plástica. Mas como ele teria conseguido em apenas três dias, fugir, fazer uma plástica, recuperar-se e aparecer na minha frente daquele jeito?
_Você não é o Daniel. - eu constatei meio abobalhada, embora a frase tenha soado como uma pergunta - Onde estou? Há quanto tempo estou aqui? O que você quer de mim?
Aquele homem espalmou as mãos, em sinal para que eu me acalmasse. Era magro, alto e devia ter cerca de quarenta e cinco anos.
_Uma coisa de cada vez. - ele disse e percebi enquanto falava, que devia sofrer de alguma anomalia no palato, que costumamos chamar de “língua presa” - Meu nome é João Miguel, pode me chamar por JM. Você está na minha casa, está aqui há quase vinte e quatro horas e acabou de acordar da sedação. Sobre o banco vai encontrar uma blusa de lã e um cobertor. Deve estar com fome também. Estou preparando o jantar que logo estará pronto. Tenha calma e paciência, gritar não irá ajudá-la.
Dizendo isso ele se virou e começou a sair. Chamei-o devolta e repeti a pergunta sobre a razão de ter sido sequestrada, ele limitou-se a dizer:
_ Prefiro vê-la como minha convidada, mas suponho que não teria aceito ao convite de um desconhecido, por isso trouxe-a dessa forma...
Gritei uma série de perguntas, mas ele só repetiu que não adiantaria gritar, que isso só o aborreceria, pois ninguém além dele poderia ouvir meus gritos.
_Quando precisar me chamar, faça-o educadamente, sem histeria e virei atendê-la, mas se gritar, não virei. - ele instruiu, saindo apressadamente em seguida.
Do que se tratava tudo aquilo? Minha mente tentou em desespero encontrar uma explicação. Quem era aquele tal de JM? O que ele queria dizer como “sua convidada”? Seria ele algum cúmplice do Dr. Daniel? Mas se era, onde estava o Macabro? Seria eu o prato principal a ser servido quando ele chegasse?
Ao meu redor, os vidros estavam presos com firmeza sobre os trilhos e a porta estava trancada. Chutei-a várias vezes e com toda a força que possuía. Tudo o que consegui foi fazer barulho. Pensei em jogar o banco de jardim sobre ele e quebrá-lo, mas intuí que não seria assim tão fácil sair daquele lugar. De fato o banco estava parafusado ao chão e além dele não havia mais nada que eu pudesse usar. Da cozinha vinha o cheiro de cebolas refogadas no vinho, meu estômago se contorceu de fome. Pensei em chamar por João Miguel e lhe perguntar todas as coisas que me passavam pela cabeça, mas tive medo de irritá-lo. Nosso breve contato fora suficiente para que eu percebesse que ele era do tipo que se zangava com facilidade, por isso me sentei sobre o banco, aceitando o abrigo da blusa e do cobertor, amargando minha má sorte. Que lugar era aquele? Não devia estar mais no Rio de Janeiro... fazia muito frio, coisa atípica na capital carioca. Pelo clima poderíamos estar em Petrópolis, ou Teresópolis, ou São Paulo... qualquer lugar, desde que afastado das pessoas que não ouviriam meus gritos, que não dariam pela minha falta...
Chorei como não fazia desde a morte da minha avó. Revi minha vida em todas as suas fases, revi erros, reavaliei minhas conquistas, frustrações e tudo o que ainda esperava conseguir. Não estou pronta para morrer, foi minha conclusão.
Uma hora mais tarde João Miguel apareceu na sala de jantar empurrando um carrinho de alimentação contendo uma bandeja cheia de comida e bebidas. Sentou-se à cabeceira da mesa de onde podia me observar. No meu cativeiro, uma lâmpada foi acesa numa arandela sobre o banco onde eu estava.
_Temos um excelente foundue de carne, com queijo gruière e queijo emental, um risoto de aspargos e uma mousse de tomate com pesto de manjericão. Receio ser obrigado a deixá-la olhando por enquanto. Sei que é grosseria da minha parte, mas não posso serví-la primeiro, o risoto esfriaria... compreenda que por ter tido todo o trabalho, é meu direito, por assim dizer, comer enquanto a refeição ainda está quente, mas não se preocupe, há o suficiente para nós dois e eu a servirei assim que tiver terminado a minha parte.
Meu estômago reclamou, mas procurei não demonstrar interesse pelo jantar, estava obstinada a passar fome e não deixar muito de mim sobrando para o deleite do Dr. Daniel e seu amigo misterioso.
_Você é bem quietinha, não? Esperava que fosse mais falante, afinal, se é uma escritora, deve ter muito sobre o que dizer... A última pessoa que esteve em seu lugar, precisou perder a língua para compreender que desejo estar em paz no meu lar. Ela não parava de gritar, queria saber o que eu tinha feito com seu bebê. - João deu uma garfada no risoto e o saboreou lentamente antes de engolir com a ajuda de uma taça de vinho – Em geral não faço uso de brutalidade, mas você tem que entender que esta regra só funciona quando há cooperação.
Ele continuou comendo e num dado momento perguntou se eu não estava curiosa para saber o que ele tinha feito com a mulher e seu bebê.
_Acho que prefiro não saber. -respondi tremendo.
_Mas você parecia muito interessada em saber o que o Dr. Daniel fez. Não é por isso que o estava visitando? Para escrever um livro a respeito dele?
Não queria conversar com aquele homem. A sugestão do que pudesse ter ocorrido à mulher e seu bebê era tão forte, repugnante e assustadora, que desejei morrer subitamente e me libertar de tudo aquilo.
_O que vocês querem de mim? Por que eu?- lamentei sentindo as lágrimas rolando quentes sobre minhas bochechas frias.
JM sacudiu os ombros.
_Eu particularmente só quero agradar... – e dizendo isso tornou a se concentrar na comida ignorando meus apelos e perguntas.
João terminou sua refeição e saiu da sala de jantar. Minutos depois ouvi um barulho acima de minha cabeça. Da janela no andar superior, a que se abria para aquele jardim de inverno, um cesto preso a uma corda foi lançado até a altura das minhas mãos. Ignorei-o e ouvi a voz dele me advertindo:
_É melhor você aceitar a comida. Seria muita grosseria da sua parte rejeitá-la e isso me deixaria muito chateado. Muito mesmo.
Peguei o conteúdo do cesto. Havia risoto, alguns legumes cozidos, pedaços de carne banhados no fondue de queijos já frio, além de duas garrafas plásticas, uma com água, outra com vinho e nenhum talher.
Comi apenas os legumes cozidos usando as pontas dos dedos. Mal pude olhar para a carne sem ter a impressão de estar vendo os pedaços do tal bebê.. Depois de ter comido os legumes, ainda fui acometida por um terrível sentimento de culpa. Senti como se estivesse na estória de João e Maria, sendo engordada para satisfazer a fome da bruxa.
_Há um balde debaixo da torneira, use-o se precisar ir ao banheiro. Não brinque com a água, pois esta noite fará muito frio.
Depois de dizer estas palavras, João Miguel apagou todas as luzes e a casa ficou mergulhada na escuridão.
Aos meus ouvidos chegavam barulhos noturnos de grilos, rãs e um zunido meio distante de carros passando à grande velocidade. Intuí que estava em algum lugar fora da cidade. Que cidade? O odor no ar me fazia lembrar São Paulo, com aquele cheiro de merda característico da poluição do Tietê e do Pinheiros, misturada com a fumaça química das indústrias, mas também havia cheiro de mato e de água fresca ali por perto... O frio que descia do teto de treliça combinava com minha suspeita. Era um frio de garoa de inverno paulistano, devia estar fazendo uns seis ou sete graus e a blusa de lã com o cobertor eram insuficientes para me manterem devidamente aquecida.
Para piorar eu não tinha sono. Havia dormido por quase vinte e quatro horas sob efeito de algum anestésico e me sentia descansada, disposta a sair voando se tivesse asas. No escuro não podia fazer muito mais do que tatear as coisas ao meu redor, procurando desesperadamente por um ponto fraco naquela jaula, que me permitisse a fuga.
Tentei desparafusar o banco, mas tudo o que consegui foi machucar as pontas dos meus dedos. O balde que ele havia me deixado não possuía uma alça de metal, senão eu teria improvisado uma ferramenta para a fenda dos parafusos... a comida havia vindo sem talheres e o vidro parecia resistente demais para que eu o quebrasse com os pés.
Andei de um lado para o outro naquele jardim que devia ter cerca de nove metros quadrados. Andar de lá para cá e daqui para lá era a única forma de me manter aquecida. Pensei na história da mulher e do bebê que tinham estado ali antes de mim, seria verdade? Seria possível que Daniel fosse realmente inocente das acusações e aquele tal de JM fosse o verdadeiro canibal assassino? Ele sabia que eu era escritora, que visitara o Dr. Macabro no hospital-prisão e onde eu morava. Talvez fosse o admirador secreto de Daniel, aquele que matara o seu primeiro advogado... Neste caso o que ele queria de mim? Que mal eu havia feito?
Lá fora um cachorro latiu, devia ser algum cão de raça grande, pois era um latido forte e feroz.
Os minutos iam passando e um antigo relógio de pêndulo, em algum lugar da casa, marcava as horas com badaladas. Lembrei-me o do que os prisioneiros diziam sobre o tempo, quando se está encarcerado, e a noite ia se arrastando longa e gelada. Andei naquele cubículo até ficar exausta e tentei em vão dormir sobre o duro banco de jardim.
Não sei descrever as emoções que me afligiam. Chorei, me revoltei, chorei de novo e fiquei variando entre um e outro louco pensamento de fuga, povoado pelas imagens grotescas de pedaços de corpos embalados e congelados que eu tinha visto nas fotografias dos autos do processo do Dr. Daniel. Se ao menos eu tivesse acreditado nele... poderia a esta hora estar no conforto da pensão em Franco da Rocha, escrevendo meu livro...
Finalmente o céu começou a clarear, o dia nasceu e a temperatura subiu um pouco. Quando o relógio marcou oito horas da manhã, JM desceu para a cozinha. Passou pela minha “jaula” com um lacônico “bom dia”, mal olhando na minha direção. Alguns minutos mais tarde subiu até o dormitório e fez descer pela janela o cesto com café, pão com manteiga, suco de laranja, biscoitos de nata e geléia de morango.
A fome apertava. Num canto do jardim de inverno ainda estavam os restos do jantar que eu recusara a comer.
_Você não jantou. – ele constatou com a cabeça para fora da janela – Uma pena, pois não sou do tipo que fica implorando pelas coisas... por outro lado, não precisarei me preocupar com seu almoço. Ainda tem comida suficiente aí.
Ele desapareceu pela janela e eu gritei: _Espere!
_O que foi?
_O que você quer de mim?
João Miguel fez um muxoxo: _Ainda não sei exatamente. Tenha paciência...
_Paciência?
_Não comece a gritar. Não quero ser rude com você. É minha convidada, cozinhei um bom jantar, preparei um bom café da manhã, não pode ser um pouco mais agradecida?
_Me dê outro cobertor. – eu implorei.
_Se comer tudo o que está aí, te darei quantos cobertores desejar. – ele disse desaparecendo novamente.
Chorei e não vou mais contar quantas vezes fiz isso naquele dia.
Poucas vezes na vida paramos para pensar na natureza da liberdade. Sabemos que a liberdade, mesmo nos países mais democráticos, não é ilimitada e na maioria das vezes sentimos o peso das restrições impostas pelo dinheiro, pelo trabalho, pelas responsabilidades. Posso dizer que todos esses problemas são triviais. Presa neste jardim de inverno eu jurava a mim mesma que me tornaria uma andarilha, se um dia conseguisse escapar. Não iria mais trabalhar, nem pagar impostos, iria viver viajando de cidade em cidade, de país em país, comendo o que me dessem, dormindo onde pudesse, porque o que há de mais importante na vida não é o conforto, o dinheiro, nem nada que as coisas possam nos proporcionar, mas a pura e simples mobilidade.
Eu queria poder sair e começar a caminhar, e caminhar, e caminhar sem nunca mais parar de andar. Queria ver o mundo, queria ir para um lugar mais quente, viver pura e simplesmente, mais nada.
JM cumpriu sua promessa e não apareceu à hora do almoço. Deve ter saído da casa, pois não ouvi qualquer barulho até as quatro da tarde, quando ele finalmente veio, sentou-se ao piano e começou a tocar, exibindo-se para mim.
Não sei que peça era aquela, mas ele a tocou lindamente. Se não fosse pelo meu estado cativo, eu teria aplaudido com entusiasmo. Jamais fui culta ao ponto de ir assistir concertos musicais, ou estudar sobre o assunto, nem toco qualquer instrumento, mas a peça que ele executou parecia contar uma história, a triste história de alguém que mal tinha começado a viver e já estava com os dias contados...
Quando terminou de executar a peça olhou diretamente para mim, à espera talvez dos meus aplausos.
_Não gostou?
Não respondi.
_Talvez preferisse ouvir músicas sertanejas...
_Não gosto de músicas sertanejas... – respondi me arrependendo em seguida, com medo de que ele ligasse um rádio e me torturasse assim.
_De que tipo de músicas você gosta?
_Não sei. Não sou de ouvir música... acho que gosto de músicas desse tipo, como essa que você executou.
_Sonata em Ré Menor de Mozart. – ele sorriu – Se gostou ouça esta.
Em seguida ele começou a executar uma outra peça. Seus dedos martelavam as teclas do piano com fúria e rapidez. Disse que não entendo de música mas sei que diante de mim havia um virtuoso instrumentista. Quando acabou ele suava e parecia estar em êxtase.
_Isso foi Tchaikovisk. Concerto para piano n° 9.
_Você toca muito bem. Onde aprendeu? – arrisquei um pouco de simpatia...
_Todas as pessoas com boa educação familiar aprendem a tocar piano antes mesmo de saberem ler e escrever. É uma pena que nem todas as pessoas possam ter boa educação. Você por exemplo, não aprendeu a agradecer por uma boa hospitalidade. Não tocou no seu café da manhã, nem almoçou os restos do jantar. Isso me desagrada muito, pois não é fácil preparar uma boa refeição. Fiquei horas na cozinha e estou me sentindo insultado com sua recusa.
_Não vou ficar aqui nesta jaula engordando para servir de prato principal a você! – eu gritei em pânico, perdendo o controle e qualquer noção de estratégia – Me tire daqui! Me tire daqui e eu prometo que não direi nada a ninguém. Na verdade se você me soltar eu vou embora do Brasil...
_Acalme-se. – ele pediu vindo até o vidro. Usava uma camisa bem alinhada e calças de lã feitas sob medida. Tinha cabelos grisalhos nas têmporas e estava começando a ficar calvo no alto da testa. Usava cavanhaque e bigode, que lhe davam um aspecto de pervertido sexual... – Já me desgostou muito não comendo a refeição que preparei com tanto carinho, não vai começar a ter chiliques histéricos agora, vai?
_O que você quer de mim? Por que eu estou aqui?
João sacudiu a cabeça e saiu das minhas vistas. Gritei, gritei o mais alto que pude. Queria que ele abrisse a jaula, que ele viesse tentar arrancar a minha língua, assim, talvez eu tivesse uma chance de fuga, ou fosse morta de uma vez por todas, pondo fim em tudo aquilo. Ao contrário do que eu esperava, ele apareceu no alto da janela, com uma mangueira de água.
_Eu disse para você não gritar. – advertiu ligando a bomba. Tentei esconder do jato de água gelada, mas ele conseguia me alcançar em qualquer canto daquele jardim, rindo enquanto me acertava. Por fim fiquei encharcada da cabeça aos pés. O pequeno jardim virou uma pequena piscina rasa, com a água escorrendo lentamente pelo ralo. Já passava das cinco e o Sol de inverno já havia desaparecido. Aquele jato de água colocara um fim aos meus gritos e também a qualquer esperança de conseguir me aquecer durante a noite.
_Vai ficar molhada no frio, sem cobertores e sem o jantar para aprender que as regras desta casa devem ser obedecidas. – ele disse antes de fechar a janela.
No chão, a comida que eu rejeitara estava encharcada e estragada por respingos de lama do canteiro de flores. A fome e o frio eram tudo o que eu possuía naquele cativeiro, onde ironicamente, as plantas pareciam bem felizes.
Por volta das oito da noite JM passou pela sala sem olhar para mim e foi até a cozinha. Ficou ali por algumas horas, trabalhando numa refeição que me pareceu apetitosa pelos odores que chegavam até meu nariz. Quando saiu, não trouxe consigo o carrinho, nem qualquer prato de comida. Ao invés disso, abriu uma garrafa de vinho, ligou o aparelho de som e sentou-se diante da jaula de vidro, ouvindo uma canção de bossa nova.
Ficou me observando fixamente. Eu tentei falar, pedi que me trouxesse roupas secas, cobertores, qualquer coisa que me aquecesse por aquela noite. Ele ignorou meus apelos e continuou em silêncio, apenas me observando.
_Pelo amor de Deus! Fale comigo! Explique essa situação! O que foi que eu fiz de errado para você me odiar tanto?
João riu e seus dentes eram alongados, brancos e alinhados.
_Não odeio você! – ele respondeu com aquela língua presa – Não é nada pessoal. Você é minha convidada...
_Convidada para o quê? – perguntei temendo a resposta.
_Para o jantar...
Meu Deus! Esse canibal quer mesmo me engordar e me comer...
_Eu sou doente. – disse improvisando – Tenho uma grave doença, preciso de medicação constante. Tenho hepatite do tipo C...
João riu às gargalhadas. Levantou e serviu mais uma taça de vinho, trocando o disco de bossa nova por outro, acho que de Tom Jobim.
_Você não é doente coisa nenhuma. – ele falou – está dizendo isso porque acha que vou lhe comer no jantar.
_E não vai?
_Vamos ter paciência e esperar...
_Esperar pelo que?
_Pelo outro convidado.
Meu Deus! Mais um? Quantos canibais existem neste mundo?

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